segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

O Mistério das Coisas

Enquanto precipitava a grande torrente, escondia-se furtivamente a pequena semente que ainda hoje guarda o segredo das multidões.
Ali perto, com sede de mais conhecer, uma pequena criança desaparecia por entre a espessa floresta.
Com seu olhar úmido, perscrutava o grande céu, berço de pensamentos imbricados em reflexões cinzentas.

“Corra sem parar e não olhe jamais para trás: uma vez que vais, não regressas mais à origem de todas as coisas.”, diziam vozes ancestrais.

***

Transmuta-se, então, devagar a casca. Depois, dolorosamente, o mundo, com seu grande cinzel, modelará o seu espírito. E, em breve, perceberás que é necessário estender as mãos e aninhar o pequeno mundo entre seus longos dedos.

***

Alguns sóis, luas e estrelas no firmamento passam céleres...
E um dia, em um instante cheio de significados, a pequena vislumbra o grande mistério. Percebe a maestria de Tudo, para tão logo, tão rápido quanto os passos largos dados na grande estrada, entender que a singular maestria de Tudo é ser Nada.

***

Perscruta a imensidão e outras dúvidas a invadem.
Ansiosa por respostas e palavras, assiste ao andar dos grandes ventos na esperança de um sopro preencher seus anseios mais profundos.

Quando alguns nobres do Norte se aproximam, ergue seu olhar à família dos Ventos Boreais. Contudo, impávidos e gelados, seus ruídos só mergulham-na em outras questões.

Questiona à Ventania do Sul. E pequenas rajadas frias sussurram ao longe:
“Como ousas perguntar, estúpida menina?”.
“Como ousas sonhar a epifania do grande mundo?”.

O ruído do globo que nada responde dilacera a pequenina alma aflita por respostas, enquanto, não tão longe, espreita-lhe os passos uma atenta coruja, filha da noite úmida.

***

Tu não a enxergas. E tudo silencia para o nada, quando tu ousas com o olhar uma dúvida para o mundo.
Em sua concha ancestral, tu não és ainda capaz de escutar o abafado pio da sabedoria do globo.

***

Perdida, absorta na grande falta de sentido, tu andas por prados alhures.
Caminha por dias em segundos. Procura por anos, inserida no tempo de alguns minutos.

Enquanto isso, alguém aqui lhe diz palavras de fazer pensar, acendendo luzes pequeninas em trevas cândidas. Mais à frente, aquele abafa pequenos lumes, fazendo-a adentrar em pórticos incolores.  

Tempestades caem em ti, encharcando o teu coração vazio.
Caminha por lugares, esvazia sentidos, deixando pegadas de cansaço oriundas de teu espírito esgotado.

***
Sente à beira do caminho e não penses mais, pobre mulher.
Olhe ao seu redor com atenção...
Tu não sentes mais as relvas que dormiam sob ti,
tocadas outrora por brisas, frutos ditosos do fim de todos os lugares?

Acorde, pequena criança, e olhe ao redor.
Vês? O mundo envelheceu.
Heras cresceram sob os teus pés gelados.
Outras eras deitaram suas mãos sobre suas costas juvenis, hoje arqueadas pelas dores do pensar.
E a mão do tempo acarinhou teu corpo hirto, enquanto dormias o sono da ignorância.

***
Teus olhos podem se abrir. Grandiosas portas para a imensidão...
E toda resposta está tão perto.

Abra o céu depois da grande tempestade. E, solenemente, perceba que descansa a pequena semente fugidia em grandioso abrigo do tempo transmutada - tão-somente junto de ti.



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