sexta-feira, 15 de abril de 2011

Niccolò Machiavelli... no Inferno?

Um dia desses, sem grandes pretensões, fui fazer uma pesquisa na área de Ciência Política, a fim de pensar um pouco em um seminário que em breve, junto a mais alguns colegas, terei de apresentar. A priori, nosso objetivo é tentar apresentar Montesquieu, o autor de Do Espírito das Leis, fugindo um pouco àquela ideia de enquadramentos strictu sensu. Assim sendo, além de pensar naquele a quem muitos creditam o nascimento da ideia da tripartição dos poderes, iremos também pensar em autores que foram extremamente importantes para que o solo da teoria política fosse sedimentado, a fim de que outras construções ao longo do tempo se firmassem. Um jogo dialético e complicadinho, eis aí a nossa missão.
Alguns colegas falarão de Rousseau; outros se deterão em Hobbes; alguns, por sua vez, pensarão no inglês John Locke; e um outro grupo irá pensar em uma figura que eu acho extraordinária no campo do pensamento político: Maquiavel - algo que me faz voltar à origem da minha reflexão da madrugada. 
A questão é que posso dizer que eu estava fazendo uma pesquisa quando encontrei, na Biblioteca Central da Universidade Federal de Goiás, um livro um tanto quanto peculiar, que muito me chamou a atenção: Maquiavel no Inferno.
O título, é claro, mexeu comigo desde o início. Afinal, o que o autor quer apresentar em um livro como esse? Seria este livro apenas uma ficção, a fim de chamar atenção para esse pensador que, ao longo do tempo, teve imputado à sua pessoa um forte preconceito, a ponto de sua designação pessoal se tornar um adjetivo para a história?
Como diz a pequena orelha desta obra, Maquiavel e maquiavélico já foram incorporados à linguagem de todos os dias, sendo que tanto o nome quanto o adjetivo cristalizaram-se de tal modo que poucos procuram entender qual é a importância desse pensador. Tal fato mostra que houve uma difusão única da obra e do pensamento de Maquiavel, contudo, mais do que isso, esta circunstância encobre uma questão: o generalizado desconhecimento da obra e do próprio pensador, que é, sem dúvida, um dos maiores pensadores políticos da história moderna.
Afinal, quantos param para pensar acerca do "mito" do maquiavelismo? Quantos já tentaram pensar acerca do porquê de Maquiavel ter dado origem a um termo pejorativo e “grudento” por toda a posteridade? Com certeza, houve aqueles que pensaram acerca desse fato, mas isso não encobre a questão de que muitos passam por cima dessas “expressões” sem ao menos fazer dançar o tico e o teco que vivem em suas cabeças.
Ora, em pouco tempo, dois anos para ser exata, a obra O Príncipe estará completando 500 anos. Afinal, foi em 1413 que Maquiavel, em sua Florença, começou a pensar acerca desse texto fantástico. Está aí uma oportunidade para pensarmos nas consequências e no valor dessa grande obra.
Chamem-me do que for, mas para mim Maquiavel apresentou em O Príncipe uma visão extraordinariamente realista de seu tempo (e, por que não dizer, do nosso?). Cruel? Maldoso? Impiedoso, simplesmente por expor sua visão realisticamente? Hmmmm... acho que não. Ao escrever aquela obra, Maquiavel não estava, conforme muitos pensam, dando a chave para o poder se instaurar de um modo “maquiavélico” e brutal. Para além de suas "dicas" ao Príncipe, ele nos deu a chance de pensar acerca do poder de nossos e de outros governantes e de como este poder pode se estabelecer, concedendo-nos a oportunidade de conhecer os mecanismos pelos quais o mesmo é estabelecido. 
Ora, se o conhecimento nos dá a chave para que possamos escolher os nossos caminhos, não foi a obra de Maquiavel um presente para as pessoas que realmente o leu? Eu penso que sim... Aliás, penso que, para aqueles que realmente o leu, a leitura foi um divisor de águas. Entretanto, para aqueles que só viram o que estava por cima, o texto não passou de algo diabólico e cruel. Essa, aliás, é a gênese de muitos problemas de interpretação e de preconceitos ao longo de mais de 5 séculos: leituras rasas que só captam no texto apenas o que está em sua superfície, sem tentar pensar o que habita a sua profundidade...
Não vou ir muito além com essas discussões, primeiro, porque eu teria de me deter em outras questões maiores, e, segundo, porque o tempo de que disponho não me permite grandes devaneios filosóficos... De qualquer modo, ante a ideia de muitos que quiseram colocar Maquiavel no inferno, fica aqui a minha defesa desse grande pensador que amava a sua Florença, a sua Itália fragmentada... Aliás, o livro é muito bom para se pensar no inferno habitado por esse pensador "maldito".
Pensando nessa verve maldita, fica a minha saudação: grandes são muitos malditos... 
E, para fechar minha reflexão, exponho uma ideia que muito me agrada: os príncipes, no final das contas, somos nós... os grandes interlocutores da obra de Niccolò Machiavelli.
Vida longa a todos nós, príncipes e malditos...


Que saibamos ir além da mera superfície para apreciar as coisas...

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