segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Lado B


Há não muito tempo, tentei dar um conselho a uma pessoa. E quando fiz isso, eu estava pensando em outras coisas. Falando sobre as atitudes de alguns rapazes em suas abordagens “românticas”, eu falei de Werther, o grande protagonista de uma bela obra de Goethe. Pensando na atitude da personagem do Romantismo Alemão, acabei pensando também na atitude de algumas jovens que agem de forma estranha, tentando se autoafirmar no mundo. O fato é que, ao dar o conselho, acabei pensando demais sobre o comportamento de uma menina que eu conheci e que, de alguma forma, me fez refletir sobre inúmeras coisas – tanto que eu resolvi escrever sobre isso.
Um fato real é que é muito difícil eu ter antipatia por alguém e não lutar para revertê-la. Contudo, com essa menina, eu não lutei nada.  Na verdade, sempre que uma oportunidade redondinha surgia, eu acabava falando algo para evidenciar a babaquice implícita ou explícita em seu comentário primordial. Era como se eu quisesse dizer “veja aí o quanto você é sem noção”. Por que eu fazia isso era o que eu me perguntava depois.
Essa menina é bem jovem – acho que tem quase 16 anos.  Uma menina até bonita, que crê em coisas e valores que no fundo ela nem sabe direito o que são (pelo menos é isso que eu quero acreditar).
Muito da minha irritação com ela provinha do fato de que eu desejava que ela percebesse um pouco do que ela estava dizendo, quando soltava as suas frases e comentários. Em dado momento, percebi que o melhor a se fazer era eu, simplesmente, isolar aquele caso e não me meter – até porque bem nenhum eu estava fazendo com as minhas intervenções...
Refletindo sobre essas meninas-ocas (desculpe-me a expressão), eu fico pensando por que tantas pessoas aceitam representar este papel vazio apenas para chamar atenção. Elas chamam atenção (que é seu objetivo predominante), no entanto, tolas, elas não percebem que aquilo que as fazem por segundos “brilhar” se esvai em pouquíssimo tempo. Em primeiro plano, temos apenas um brilho fosco, de cores duvidosas que desbotam a um estalar de dedos. Na verdade, o brilho que elas pensam existir em suas tiradas faz com que elas se diminuam, de tal forma que acaba originando um misto de pena com um sentimento de “ah, você merece essa desconsideração mesmo”.
Minha irritação com essas crianças não nasce por conta da tosca índole que elas acabam usando como muleta para aparecer para o mundo – minha irritação nasce com a conjuntura dos valores e das coisas, de um modo geral, que não fornece o debate ou o acesso a outros padrões, a outras ideias que possam, pelo menos, contribuir como uma espécie de alicerce para essas meninas que veem e querem do mundo uma oportunidade para expor seus corpos, fazer de seus decotes pequenas armas para conseguir algo que elas nem sabem o que é...
Transitórios são seus valores... Tanto que depois de algumas estações, elas já não sabem mais o que querem – nem o que queriam... E em suas paranoias consumistas – e nisso entra corpos e bens – elas vão enlouquecendo outras pessoas, até que alguém as enxovalha pelas ruas ou as abandona sem pensar, fazendo com que elas criem metas ainda mais abjetas, para tão-somente isolar com um band-aid barato aquilo que as afligiu. E num ciclo vicioso, elas vão descendo cada vez mais, até, um dia, quem sabe acordar para algo ou, na pior das hipóteses, se tornarem pessoas frias, amargas e sem esperança – o tipo de pessoa que passa o resto da vida a lamentar e a infernizar outras vidas.
Não é moralismo barato, mas as pessoas, as jovens em especial, deveriam querer um pouco mais da vida. Deveriam querer lutar um pouco mais. Deveriam ter um pouco mais de garra. Elas precisam de uma espécie de lado B, um lado alternativo que dê a elas mais do que elas conseguem obter nesse mundo vazio em que elas querem viver e, muitas vezes, vivem.
Ao invés de criarem desculpas e pequenos segredos sobre suas ambições futuras, deveriam acreditar mais em si mesmas, querer mais para si e mostrar seus rostos e suas vontades de modo real e íntegro.
Acho que a minha irritação com essa guria em particular é uma irritação com toda essa situação que faz com que tantas meninas, que podiam se destacar em outras áreas, acreditem que não possuem capacidade para ser mais do que um corpo sem uma massa encefálica atuante.
Está aí: essa coisa de acreditar que uma mulher não pode se sobressair em vários campos ao mesmo tempo me irrita. A limitação do pensamento de algumas dessas meninas é o que me entristece. Porque uma coisa é deixar outras pessoas ter o pensamento limitado. Isso é algo até certo ponto remediável, uma vez que a gente pode tentar mudar a cabeça de algumas dessas pessoas com as nossas ações e nossos exemplos. Outra coisa, contudo, totalmente diferente é você também fazer parte desse rol de pessoas que desacreditam a multiplicidade que habita a alma de uma mulher.
Em todos os campos, em todas as áreas, as mulheres podem ser polivalentes. Uma mulher pode, sim, saber discorrer sobre as ideias de Nietzsche, Kant, Heidegger e logo depois fazer uma ponte com o conflito entre palestinos e judeus, falar das falcatruas no Poder Legislativo, fazer cálculos mirabolantes, fechar grandes acordos, conduzir grandes negociações e ainda assim falar das últimas tendências de moda, das novas linhas de maquiagem dessa ou daquela marca e tantos outros assuntos... Não sei, mas essas meninas e tantas outras mulheres deveriam se dar um pouco mais de crédito...
Na minha cabeça, a mulher deve ter o mundo e suas possibilidades perto de si. É necessário que o mundo seja um objeto em nossas mãos. É preciso que saibamos manipular o mundo – e não que sejamos um objetozinho sem valor na superfície do grande globo. A questão é como inserir um pouco desse pensamento na cabeça de meninas como essa que eu conheci?
Uma das frases que eu ouvi acerca de nossa afinidade zero foi “o santo de vocês duas não bateram”. E isso talvez seja porque somos em muitos pontos o oposto uma da outra... Ainda assim, com todas as diferenças quanto ao modo de encarar a vida e suas oportunidades, eu queria poder desfazer essa impressão e apresentar a essa guria algo que eu vejo e, nessa simbiose, ser apresentada por ela a aspectos que eu, ser ainda muito ignorante, desconheço. Os dois lados podiam se complementar e as coisas poderiam ficar mais fáceis dessa forma.
Em um mundo em que o lado A, infelizmente, apresenta uma canção furada e ruim para muitas meninas e mulheres, as pessoas deveriam tentar mudar o lado do disco. O lado B, nesse caso, pode ser muito mais interessante...

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