sábado, 2 de julho de 2011

Fragmentos da vidência do jovem Rimbaud...



O Relâmpago
 
O trabalho humano! eis a explosão que ilumina o meu abismo de tempos em tempos.
“Nada é vaidade; rumo à ciência, e avante!” clama o Eclesiastes moderno, ou seja Todo mundo. E contudo os cadáveres dos maus e dos ociosos caem sobre os corações dos outros... Ah! rápido, mais rápido; lá embaixo, além da noite, essas recompensas futuras, eternas... irão escapar-nos?...
– Eu, que posso fazer? Conheço o trabalho; e a ciência é muito lenta. Que a prece galopa e a luz atroa... Bem o vejo. É muito simples; e faz muito calor, passarão bem sem mim. Tenho o meu dever, dele me orgulharei como fazem muitos, pondo-o de lado.
Minha vida está gasta. Mas vamos! flanemos, fantasiemos, ó que lástima! E viveremos a nos divertir, a sonhar amores monstruosos e universos fantásticos, queixando-nos e criticando as aparências do mundo, saltimbanco, mendigo, artista, bandido, – padre! No meu leito de hospital, o odor do incenso retornou poderosamente; guardião dos aromas sagrados, confessor, mártir...
Nisso reconheço a minha infame educação de infância. Que fazer!... Viver meus vinte anos, se os outros também o fazem...
Não! Não! agora eu me revolto contra a morte! O trabalho parece leve demais para o meu orgulho: minha traição ao mundo seria uma tortura curta demais. No derradeiro momento, eu atacaria à direita, à esquerda...
Então, - oh! - pobre alma querida, a eternidade não estaria perdida para nós!

Arthur Rimbaud. Uma Estadia no Inferno (1873).


Um comentário: